Relatores da Organização das Nações Unidas
(ONU) criticam a PEC 55, que cria um limite para ao aumento dos gastos
públicos, e alertam que a medida viola direitos humanos. Os especialistas ainda
questionam a decisão do governo de Michel Temer de "congelar o gasto
social no Brasil por 20 anos".
Na avaliação do relator especial da ONU para
extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alston, a medida é
"inteiramente incompatível com as obrigações de direitos humanos do
Brasil". Sua posição foi apoiada pela relatora para Educação, Boly Barry
Num comunicado publicado em Genebra, o
representante da ONU alerta que o "efeito principal e inevitável da
proposta de emenda constitucional elaborada para forçar um congelamento
orçamentário como demonstração de prudência fiscal será o prejuízo aos mais pobres
nas próximas décadas". A emenda, conhecida como PEC 55, pode ser votada
pelo Senado na próxima terça-feira, dia 13 de dezembro.
"Se adotada, essa emenda bloqueará
gastos em níveis inadequados e rapidamente decrescentes na saúde, educação e
segurança social, portanto, colocando toda uma geração futura em risco de
receber uma proteção social muito abaixo dos níveis atuais", alertou.
Alston pede, por meio da carta aberta, que o
governo realize um debate público para, antes de sua votação, avaliar o impacto
que a medida teria para "os setores mais pobres da sociedade e que
identifique outras alternativas para atingir os objetivos de austeridade".
Há cerca de uma década, o relator especial
criticou duramente o comportamento da polícia brasileira, levando o Itamaraty
sob o governo de Luiz Inácio Lula da Silva a criticá-lo. Agora, seu alvo são os
gastos sociais.
"Uma coisa é certa", disse Alston.
"É completamente inapropriado congelar somente o gasto social e atar as
mãos de todos os próximos governos por outras duas décadas. Se essa emenda for
adotada, colocará o Brasil em uma categoria única em matéria de retrocesso
social", insistiu.
No comunicado, o relator alerta que a
proposta é feita por um governo que "chegou ao poder depois de um
impeachment e que, portanto, jamais apresentou seu programa a um
eleitorado". "Isso levanta ainda maiores preocupações sobre a
proposta de amarrar as mãos de futuros governantes", diz.
Alston admite que o Brasil "sofre sua
mais grave recessão em décadas, com níveis de desemprego que quase dobraram
desde o início de 2015". Mas o relator alerta que a PEC 55 "terá um
impacto severo sobre os mais pobres". "Essa é uma medida radical,
desprovida de toda nuance e compaixão", disse.
"Vai atingir com mais força os
brasileiros mais pobres e mais vulneráveis, aumentando os níveis de
desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual e, definitivamente,
assinala que para o Brasil os direitos sociais terão muito baixa prioridade nos
próximos vinte anos."
Alston chega a alertar que a proposta
"evidentemente viola as obrigações do Brasil de acordo com o Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais que o pais ratificou
em 1992, que veda a adoção de "medidas deliberadamente regressivas" a
não ser que não exista nenhuma outra alternativa e que uma profunda
consideração seja dada de modo a garantir que as medidas adotadas sejam
necessárias e proporcionais."
Alston elogiou o combate à pobreza nos
últimos anos no Brasil. "Essas políticas contribuíram substancialmente
para reduzir os níveis de pobreza e desigualdade no país. Seria um erro
histórico atrasar o relógio nesse momento," disse ele.
Mas aponta que "mostrar prudência
econômica e fiscal e respeitar as normas internacionais de direitos humanos não
são objetivos mutuamente excludentes, já que ambos focam na importância de
desenhar medidas cuidadosamente de forma a evitar ao máximo o impacto negativo
sobre as pessoas".
"Efeitos diretamente negativos têm que
ser equilibrados com potenciais ganhos a longo prazo, assim como esforços para
proteger os mais vulneráveis e os mais pobres na sociedade", disse.
"Estudos econômicos internacionais,
incluindo pesquisas do FMI, mostram que a consolidação fiscal tipicamente tem
efeitos de curto prazo, reduzindo a renda, aumentando o desemprego e a
desigualdade de renda. E a longo prazo, não existe evidência empírica que
sugira que essas medidas alcançarão os objetivos sugeridos pelo Governo,"
completou o relator.
Novojornal*
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